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6 de abr. de 2011

Tópicos Especiais em Tecnologia Orgânica Celulose & Papel

1. HISTÓRIA DO PAPEL

Desde os tempos mais remotos, e com a finalidade de representar objetos inanimados ou em movimento, o homem vem desenhando nas superfícies dos mais diferentes materiais. Nesta atividade intimamente ligada ao raciocínio, utilizou inicialmente as superfícies daquelas matérias que a natureza oferecia praticamente prontas para o seu uso, tais como: paredes rochosas, pedras, ossos, folhas de certas plantas, etc.
Acompanhando o desenvolvimento da inteligência humana, as representações gráficas foram tornando-se cada vez mais complexas, passando deste modo a significar idéias. Paralelamente, este desenvolvimento levou o homem a utilizar suportes mais adequados para as representações gráficas, onde a história registra o uso de tabletes de barro cozido, tecidos de fibras diversas, papiros, pergaminhos e, finalmente, o papel.

Papiro: teve origem no Egito. São tiras extraídas dos caules de uma planta muito abundante nas margens do Nilo. Tem origem por volta do ano 3.000 AC e foi usado até o início do século XX da Era Cristã.

Pergaminho: feito de peles de animais, cuja origem data do ano 2.000 AC. As formas melhor acabadas de pergaminhos (peles curtidas) apareceram por volta de 200 AC.

Papel: teve origem na China. É atribuída a Ts’ai Lum (105 DC) a primazia de ter feito papel por meio da polpação de redes de pesca e de trapos. Posteriormente utilizou fibras vegetais (de bambu), mediante um cozimento forte, seguido de maceramento das fibras (alguns autores indicam o uso de cal no processo de cozimento). Todavia, inexplicavelmente este processo de produção de polpa a partir de bambu caiu no esquecimento, permanecendo somente a produção a partir de trapos. A pasta obtida pela dispersão das fibras em água, era depurada, sendo a folha formada sobre uma peneira feita de juncos delgados unidos entre si por crinas de animais ou seda, fixada em uma armação de madeira. Formava-se a folha submergindo a peneira na tina contendo a dispersão de fibras. Secava-se a folha comprimindo-a sobre uma placa de material poroso ou então deixando-a pendurada ao ar. A técnica de produção de papel, que inicialmente foi monopólio chinês, foi apreendida pelos árabes e passou a ser fabricado em Bagdad por volta de 795 DC, difundido ao Ocidente por rotas bastante tortuosas. Os primeiros moinhos papeleiros localizados na Europa (Península Ibérica) datam de 1.094 (em Xativa) e 1.238 (em Capellades).

2. EVOLUÇÃO DA TÉCNICA DE PRODUÇÃO DE PASTA DE CELULOSE

A medida que grandes centros urbanos foram se formando em todo o mundo, foram evoluindo também as atividades burocráticas, comerciais, industriais, culturais, religiosas, etc., de suas populações.
Isto ocasionou um lento e gradual aumento da demanda de papel e, consequentemente, de trapos, única matéria-prima utilizada para a produção de papel.
O problema agravou-se mais ainda à medida que as técnicas de escrita e impressão foram sendo mecanizadas (sistema de impressão tipográfica desenvolvido por Gutemberg em 1450). Paralelamente a isso as técnicas de produção de papel foram sofrendo aperfeiçoamentos mecânicos, contribuindo com a redução de custos de produção, tornando o produto final cada vez mais barato e acessível.
Portanto, face às dificuldades crescentes de oferta de trapos para a produção de papel, a humanidade passou a pesquisar fontes alternativas de celulose, afim de suprir a demanda de papel.
Os principais acontecimentos que contribuíram para a evolução tecnológica de produção de celulose e papel foram:

- Holandesa: máquina inventada em 1860 pelos holandeses, aumentou a produção. Era uma máquina destinada a desintegrar trapos, e que chegou até nossos dias, após uma série de modificações, sem todavia alterar a idéia básica de construção.
- Reaumur: devido à extrema falta de matéria-prima, em 1719, sugere o uso de madeira como fonte de matéria-prima. Esta idéia foi reforçada por Schaffer em 1765.
- Koops: por volta de 1800, patenteia processo de produção de polpa de palha e de papel velho (início da indústria de reciclagem de papel usado).
- Cloro: descoberto no final do século XVIII dá início ao estudo de processos de branqueamento.
- Máquina de papel: a produção de papel sofre uma série de aperfeiçoamentos mecânicos a partir de 1821 – desenvolvimento da mesa formadora de papel pelos irmãos Fourdrinier (cujo nome é mantido até hoje nas máquinas de papel).
- Pasta mecânica: é desenvolvida por Keller em 1844, a partir de madeira (ainda um produto fraco e frágil). Em 1850, Heinrich Voeter utilizou uma mistura de 25% de pasta mecânica e 75% de pasta de trapos.
- Polpa sulfito: em 1857, nos EUA, Benjamim Tilgmann desenvolveu o processo de polpeamento de madeiras com sulfito, tornando a produção de papel independente de trapos.
- Polpa sulfato (Kraft): em 1884, na Alemanha, Dahl desenvolveu o processo de polpeamento de madeiras com soda e sulfeto de sódio.

3. ESPÉCIES VEGETAIS UTILIZADAS NA PRODUÇÃO DE PASTA CELULÓSICA

As matérias-primas vegetais utilizadas para a produção de pasta celulósica são bastante variadas, tais como (no Brasil):
- Plantas anuais e resíduos agrícolas: babaçu, bagaço de cana de açúcar, bambu, linter de algodão, estopa de linho e sisal.
- Madeiras: eucalipto, pinus, araucária, acácia e gmelina.

De todas as espécies vegetais, a maior fonte de matéria-prima são as fibras de madeiras provenientes de árvores ( 95% no Brasil), que são classificadas em dois tipos principais:
- Gymnospermas ou coníferas (madeiras macias/ “soft woods”) – exemplos: pinus e araucária.
- Angiospermas ou folhosas (madeiras duras/ “hard woods”) – exemplos: eucalipto, gmelina, acácia, bétula, etc.
As espécies de madeiras utilizadas no Brasil são:




FIBRAS CURTAS Eucalyptus Saligna
Originárias da Austrália e
Tasmânia
Eucalyptus Alba
Eucalyptus Teriticornis
Gmelina Arbórea Originária da Ásia
Acácia Mearnsii Originária da África do Sul
Bracatinga (Mimosa Scabrella) Espécie nativa


FIBRAS LONGAS Pinus Elliottii Originárias dos EUA e América Central (algumas originalmente provieram da Europa)
Pinus Taeda
Pinus Caribaea
Pinus Patula
Araucária Augustifolia Espécie nativa


Devido às condições climáticas favoráveis (clima tropical e semitropical), a produtividade das florestas brasileiras é bastante alta, a qual associada a desenvolvimentos biotecnológicos, atinge os maiores níveis mundiais.
Exemplos:
- Eucalipto: em algumas regiões a produtividade ultrapassa 75 m3/ha/ano;
- Pinus:  25 m3/ha/ano.

Na Escandinávia a produtividade é da ordem de 5 a 7 m3/ha/ano, enquanto que nos EUA é de 5 a 15 m3/ha/ano. Isto significa que a idade de corte entre espécies similares de árvores dá-se numa relação de aproximadamente 8/30 anos, entre Brasil e Escandinávia.

4. ESTUDO DA MADEIRA

4.1 - Composição do tronco

Conforme a Figura 1, no corte transversal de um tronco de árvore distingue-se:

- CASCA: tem a função de proteção mecânica e evitar uma dessecação demasiada do caule.
- FLOEMA: tem a função de conduzir a seiva com nutrientes.
- CÂMBIO: regula o crescimento do vegetal em espessura (desenvolve simultaneamente o floema e o xilema (*) ).
- ALBURNO: tem a função de condutor de água (suas células são ativas).
- CERNE: constituído de células inativas do xilema.

(*) Xilema: constitui o alburno (com células ativas) e o cerne (com células inativas).
Figura 1 – Seção de um tronco
4.2 - Composição química da madeira
As madeiras utilizadas na indústria de celulose possuem a seguinte composição média (Figura 3):
Celulose -  50%
Lignina – 15 a 35 %
Hemicelulose -  20%
Extrativos – 3 a 10%
Compostos minerais -  0,5%
Figura 3 – Composição química das madeiras.
Exemplos:
Bétula (folhosa) Pinho (conífera)
Celulose (%)
Lignina (%)
Hemicelulose (%)
Extrativos (%)
Compostos minerais (%) 41
20
35
4
0,5 39
27
30
4
0,5

a) Celulose
É um polissacarídeo linear, com um único tipo de unidade de açúcar (D-glicose). Seu peso molecular pode variar de 162.000 a 2.400.000.

b) Hemicelulose
Também são polissacarídeos, diferindo no entanto da celulose por conterem vários tipos de unidades de açúcar (D-xilose, D-manose, D-glicose, L-arabinose, etc.). São polímeros ramificados (amorfos) e de cadeias mais curtas.

c) Lignina
São polímeros amorfos, de composição complexa não totalmente caracterizada. Sua finalidade é conferir firmeza à estrutura (Figuras 4a e 4b). É o ligante que mantém as fibras unidas na estrutura da madeira. É resistente à hidrólise ácida e possui alta reatividade com agentes oxidantes.

Figura 4b – Modelo de lignina de coníferas

d) Extrativos
Ácidos livres: ácido acético, ácido fórmico.
- Ácidos voláteis
Ésteres

- Óleos voláteis (essenciais): hidrocarbonetos, álcoois, cetonas, lactonas, terpenos, terebintina e óleo de pinho (em coníferas).

- Ácidos resinosos: ácidos abiético e pimáricos.

- Ácidos graxos: ácidos oleico, linoleico, palmítico, esteárico, etc.
- Esteróides
- Taninos

d) Compostos inorgânicos ( 1%)
São constituídos principalmente de sulfatos, fosfatos, oxalatos, carbonatos e silicatos de Ca, K e Mg.

4.3 - Fatores que influem na análise da madeira

1. Espécie de madeira (+ importante);
2. Comportamento do crescimento (em regiões deformadas do tronco, a constituição da madeira é diferenciada);
3. Fatores hereditários da árvore;
4. Ponto de tomada da amostra
Exemplo: cerne ou camada externa, lenho juvenil ou adulto, idade, altura no tronco (na parte inferior o lenho é mais comprimido), tronco ou ramos, etc.
5. Condições e história do armazenamento da madeira antes da sua análise;
6. Método de preparação da amostra.

4.4 - Tipos de fibras

As moléculas de celulose que constituem as fibras vegetais estão agrupadas na forma de fibrilas, formando as microfibrilas e as macrofibrilas, de acordo com as Figuras 5 e 6, sendo que suas dimensões variam conforme o espécime vegetal analisado, ou seja:

Comprimento:  3 a 5 mm
Celulose de coníferas Diâmetro: 20 a 50 m
Espessura da parede primária: 3 a 5 m
- São fibras longas – tem maior valor de mercado e são mais escassas;
- Conferem maior resistência mecânica – são próprias para papeis de embalagens;
- Menor rendimento ( 48%).

Comprimento:  0,8 a 1,5 mm
Celulose de folhosas Diâmetro: 20 a 50 m
Espessura da parede primária: 3 a 5 m
- São fibras curtas;
- Maior rendimento ( 50%);
- Mais macias;
- Maior opacidade (filme mais fechado);
- Menor resistência mecânica – são próprias para papeis de impressão e escrita.
Figura 5 – Formação da fibra de celulose

Figura 6 – Esquema das paredes celulares de uma fibra

4.5 – Processo de refino das fibras de celulose As fibrilas que constituem as células (fibras) são compostas de cristalitos de celulose, e quando as fibras são imersas em água, uma quantidade de água é absorvida por todas as superfícies cristalinas expostas, provocando o seu inchamento e diminuição da atração entre as fibrilas. A ação mecânica de cizalhamento das fibras através de equipamentos denominados de refinadores, aceleram este inchamento, deixando expostas as superfícies anteriormente situadas no interior das fibras, ocasionando desta forma um aumento da superfície externa. O aumento da superfície exposta promove um maior número de contatos e ligações entre as fibras, resultando com isso um papel mais resistente. Com isso, a operação de refino das fibras de celulose, que é um processo bastante complexo, é de fundamental importância na fabricação de papel. A Figura 7 mostra alguns efeitos ocasionados sobre as fibras na operação de refino.
Figura 7 – Efeitos da refinação sobre as fibras

5. MATÉRIAS-PRIMAS DE ORIGEM NÃO-MADEIRA
Exemplos:
a) Celulose de fibras têxteis (linter de algodão, linho e sisal)
- São fibras extra-longas e extra-largas;
- São próprias para papeis especiais (papel moeda, filtros, etc.).

b) Celulose de palhas de cereais
- São fibras curtas e grossas – conferem maior fechamento da folha de papel;
- Conferem maior opacidade e lisura ao papel;
- Confere menor porosidade (fabricação de papel vegetal ou manteiga).

c) Celulose de bambu
Bambu é um termo genérico de certos vegetais classificados pela botânica como gramíneas e conhecido no Brasil como “taquara”. Suas fibras são de médio comprimento (predominância entre 2,2 e 2,6 mm) e largura média de 14 m.

6. PROCESSOS DE POLPEAMENTO
São vários os processos utilizados para produção de polpas de celulose, dentre eles:

Processo soda
Processos alcalinos Processo Kraft
Processo sulfito alcalino
- Processos químicos Processo sulfito neutro

Processos ácidos: Processo sulfito ácido

Processo mecânico
- Processos de alto rendimento Processo termomecânico
Processo químico-mecânico
Processo químico-termomecânico

- Processos de rendimento variável: processos semi-químicos

6.1 - Preparação da madeira para o polpeamento

Antes de comentarmos os principais processos de polpeamento utilizados industrialmente, vamos analisar as etapas de beneficiamento que previamente deve passar a madeira.

6.1.1 - Descascamento

A madeira extraída da floresta sob a forma de toras, antes de ser utilizada na produção de celulose deverá ser descascada, devido a:

1. A casca contém pouca quantidade de fibras;
2. Causaria maior consumo de reagentes químicos nas etapas de polpeamento químico e de branqueamento;
3. Ocuparia espaço útil nos digestores (diminuindo a produtividade);
4. Dificultaria a lavagem e depuração da polpa;
5. Diminuiria as propriedades físicas do produto final;
6. Prejudicaria o aspecto visual da pasta (aumento de sujeira).
Existem vários modelos de equipamentos utilizados para o descascamento da madeira na forma de toras, tais como:
- Descascador de tambor,
- Descascador de bolsa,
- Descascador de anel,
- Descascador de corte,
- Descascador hidráulico,
- Descascador de faca.

Dentre todos, os mais utilizados industrialmente são os de tambor e de anel.
a) Descascador de tambor

Neste equipamento, de acordo com a Figura 8, a madeira é alimentada continuamente, por meio de uma correia transportadora, em um cilindro rotativo de aço possuindo fendas longitudinais que permitem a saída das cascas. Estes cilindros são inclinados e giram à baixas velocidades, o que ocasiona o impacto das toras entre si e as paredes do tambor (providas de saliências longitudinais).
Estes impactos ocasionam o rompimento das cascas das toras, as quais são desprendidas e arrastadas para fora (pelas fendas) mediante jatos d’água (chuveiros) situados no interior do tambor.
O dimensionamento dos tambores depende de inúmeras variáveis, tais como, taxa de alimentação, comprimento das toras, diâmetro médio das toras, tipo de madeira (tipo de casca), etc. O diâmetro pode variar de 2,5 a 5,5 m e o comprimento de 7,0 a 25,5 m.
Por exemplo, o diâmetro dos tambores é geralmente de 1,6 a 1,8 vezes o comprimento das toras, por isso as toras antes de entrarem no descascador são bitoladas em mesas alinhadoras munidas de serras circulares, de modo a uniformizar seu comprimento. Devido ao custo destes equipamentos, ele é restringido à indústrias de produção contínua e de porte razoável. Além disso, estes equipamentos são montados no perímetro da instalação industrial, onde será acumulada a casca gerada.

b) Descascador de anel

Neste equipamento, de acordo com a Figura 9, a madeira é alimentada axialmente no centro de um anel rotativo, em cuja periferia estão dispostas, equiespaçadamente, facas e raspadeiras. Ambas, em ação conjunta, removem a casca.
Figura 8 – Descascador de tambor

Os descascadores de anel podem ser construídos estacionários ou móveis. Quando móvel, ele é acoplado em tratores ou caminhões, permitindo seu deslocamento e operação na área florestal.
Figura 9 – Descascador de anel
A produtividade destes equipamentos é influenciada por diversos fatores, tais como: diâmetro e uniformidade da tora, espécie de madeira (e da casca), velocidade e tipo de alimentação.

Com relação à casca gerada nos processos de descascamento, se a madeira é descascada na floresta ela servirá como formadora de “húmus” no solo. No entanto, se for descascada na indústria, a casca causará problemas de disposição, uma vez que ela representa um volume de 10 a 20% do volume total da madeira utilizada. Transportar a casca para aterro florestal seria muito dispendioso, face à sua baixa densidade aparente. A alternativa lógica de eliminação das cascas é a sua queima em fornalhas apropriadas para a geração de vapor (fornalha de biomassa), uma vez que o seu poder calorífico é da ordem de 4.000 kcal/kg, base seca.

6.1.2 - Picagem da madeira
Quando se pretende realizar um polpeamento químico de uma madeira, esta deverá ser reduzida a fragmentos (cavacos), de modo a facilitar a penetração do licor de cozimento.
As dimensões dos cavacos deverão obedecer uma distribuição tão estreita quanto possível, de modo a promover um cozimento bastante uniforme e gerar uma polpa bem homogênea, evitando desta forma um supercozimento dos menores e um subcozimento dos maiores (dentro dos limites operacionais fixados).
A melhor distribuição de tamanho recomendada situa-se na faixa de 5/8 a 3/4 polegadas, de modo a serem retidos em uma peneira com furos de 1,58 cm de diâmetro.
Os fatores mais importantes que afetam a qualidade dos cavacos são:

- direção e velocidade da tora que entra no picador;
- ângulo de corte das facas;
- velocidade de corte (alta velocidade gera alta produção e grande quantidade de finos);
- troca constante das facas (sempre afiadas).

Antes da alimentação no picador, as toras devem ser lavadas afim de retirar areia ou terra nelas contidas, visando diminuir o desgaste das facas do picador. Além disso, a madeira úmida é mais facilmente cortada, diminuindo desta forma o consumo energético e o risco de quebra das facas. Normalmente a madeira entra no picador logo após sair do descascador (quando for de tambor), vindo portanto lavada e úmida. Quanto aos equipamentos utilizados, existem basicamente dois tipos de picadores:
- de disco com múltiplas facas;
- de tambor.

a) Picador de disco (mais utilizado)

Este equipamento é o mais utilizado industrialmente, o qual, de acordo com as Figuras 10 e 11, consiste de um disco rotativo de aço, munido de facas (lâminas de corte) distribuídas na área de uma de suas faces.

Figura 10 – Picador de disco de múltiplas facas

Figura 11 – Detalhes de um picador de disco

O disco tem um diâmetro que varia de 70 a 450 cm e pode ser equipado com 4, 8, 10, 12 ou mais facas. O disco recebe a madeira através de um bocal que forma um ângulo de 35 a 45o em relação à face de corte. O ajuste das facas permite regular o tamanho dos cavacos, os quais são obtidos pelo impacto da tora com as facas, deixando o picador através de fendas existentes no disco. A velocidade de rotação do disco será regulada em função do diâmetro do disco e do número de facas. Por exemplo, para um disco com 214 cm de diâmetro, com 12 facas, a velocidade recomendada é de 450 rpm.

b) Picador de tambor

Este equipamento, de acordo com a Figura 12, consiste basicamente de um tambor de aço com cerca de 1,8 m de diâmetro e de 1,0 a 2,5 m de comprimento. A madeira é alimentada e prensada contra o tambor, cuja superfície é provida de facas, girando a uma velocidade de 30 rpm. As toras são mantidas deitadas na câmara de alimentação, com orientação paralela ao eixo rotacional do tambor.

Figura 12 – Picador de tambor

6.1.3 - Classificação e estocagem dos cavacos

Os cavacos que saem do picador são estocados no pátio e, posteriormente, passam por um sistema classificatório constituído de peneiras vibratórias.
Os cavacos graúdos retidos na primeira peneira, de malha mais aberta, são desviados para sofrerem nova divisão em um outro picador de menor tamanho, denominado de repicador. Os cavacos que saem do repicador reingressam no sistema classificatório. Os cavacos que passaram através da primeira peneira, caem em outra de malha mais fechada. Aqueles que ficaram retidos nesta última, constituem o material aceito para o processo de polpeamento e, os demais que passaram pela peneira constituem os finos. O material constituído de finos poderá ser polpeado separadamente (produto de mais baixa qualidade) ou então queimado em caldeiras (mais comum).
Quando o processo de cozimento é contínuo, o material aceito é conduzido diretamente ao processo de cozimento por meio de esteiras transportadoras ou transporte pneumático. Quando o processo de cozimento é descontínuo (em bateladas), o cavaco aceito é normalmente estocado no pátio sob a forma de pilhas antes de ser conduzido ao processo.

6.2 - Polpeamento químico

6.2.1- Mecanismo de impregnação

Sabe-se que a finalidade do polpeamento é separar as fibras ou os traqueídeos da organização compacta do sistema madeira. Esta separação é conseguida pela dissolução da lamela média, composta em sua maior parte de lignina e de material péctico, a qual mantém as fibras unidas entre si.
Para produzir pastas uniformes, deverá ser feito um tratamento químico e térmico em todos os pontos do sistema madeira. Isto somente será possível se os reagentes químicos forem transportados para o interior dos cavacos até o local da reação, ou seja, até a lamela média, onde a lignina está altamente concentrada.
O transporte para o interior dos cavacos ocorre segundo dois mecanismos:

1. Penetração do licor na madeira devido a um gradiente de pressão hidrostática;
2. Difusão de íons ou outros solutos através da água sob a influência de um gradiente de concentração.

Convém observar que a estrutura da madeira apresenta variações entre as espécies, dentro da mesma espécie e até na própria árvore. Em geral a madeira apresenta de 50 a 75% de espaços vazios, preenchidos com ar e/ou água. Normalmente, calculando-se com base no peso úmido, os cavacos contém cerca de 25% de umidade no ponto de saturação da fibra e cerca de 67% quando completamente cheios de licor.
Um teor de umidade de 50% indica que os lúmens das fibras estão cheios até a metade, aproximadamente, sendo o restante do espaço ocupado por ar.

6.2.2 - Processos alcalinos

No Brasil, cerca de 81% da produção de polpa química é feita pelo processo kraft, aproximadamente 12% pelo processo soda e os 7% restantes por outros processos.
Os dois principais processos alcalinos na produção de pastas químicas são: processo soda e processo kraft (ou sulfato). Os dois processos são similares, diferindo na aplicação do sulfato de sódio no processo kraft ou sulfato, ao invés de carbonato de sódio no processo soda, para cobrir as perdas do ciclo de recuperação dos reagentes do cozimento.
Durante o ciclo de recuperação do processo kraft, o sulfato de sódio é reduzido a sulfeto de sódio, o qual, juntamente com hidróxido de sódio, constituem os reagentes utilizados no processo kraft. Portanto é errado denominar-se de processo sulfato, pois o mesmo não atua como reagente de polpeamento, sendo o hidróxido de sódio e o sulfeto de sódio os responsáveis.
No processo kraft a presença de sulfetos no álcali acelera a deslignificação, produzindo uma pasta de melhor qualidade e com menor teor de lignina para um determinado rendimento. Em meio alcalino e temperaturas altas, as ligações carbono-oxigênio na lignina podem ser rompidas, formando fragmentos menores, mais solúveis e mais estáveis à recombinação (condensação).
Já ficou provada a combinação do enxofre com a lignina, porém a exata natureza desta reação e a causa do aumento da velocidade de deslignificação ainda não foram completamente esclarecidas. É atribuído aos íons HS- (formados pela reação do Na2S com H2O) no licor kraft uma espécie de ação catalisadora. Em uma seqüência cíclica, que começa com sua adição à molécula de lignina, é seguida pelo rompimento destas ligações pelo álcali, regenerando desta forma os íons HS-, deixando-os novamente disponíveis para novas reações e, produzindo lignina kraft contendo pequenas quantidades de enxofre.
As vantagens do processo kraft sobre os demais são:
- flexibilidade a todas as espécies de madeiras;
- tempos mais curtos de cozimento;
- a pasta pode ser branqueada a altos níveis de alvura (maior custo em relação às pastas sulfito);
- não há problemas com resinas (coníferas);
- produção de pastas de alta resistência;
- produção de subprodutos valiosos (tall-oil e terebintina);
- recuperação relativamente fácil dos reagentes utilizados.

Todavia, o processo kraft também apresenta certas desvantagens, tais como:

- alto custo de investimento na montagem da fábrica;
- problema de mau cheiro dos gases produzidos (H2S e mercaptanos).

Os cavacos de madeira, juntamente com o licor de cozimento (licor branco), sofre um aquecimento, sob pressão, em equipamentos denominados de digestores, cuja operação pode ser descontínua (Figuras 13 e 14) ou contínua (Figura 15). A temperatura aumenta gradualmente durante 50 a 90 minutos até a temperatura atingir cerca de 170 oC, a qual é mantida por um certo tempo até garantir a deslignificação da madeira e liberação das fibras.
No processo descontínuo, após o período de cozimento, uma válvula situada no fundo do digestor é aberta e a pressão empurra os cavacos cozidos para um tanque, onde a força de alívio na descarga (descompressão brusca) faz com que os cavacos desdobrem-se em fibras individuais, constituindo a pasta. Nos gases de alívio encontram-se mercaptanos e H2S, bem como terebintina (no caso de coníferas) e metanol. A terebintina e o metanol podem ser recuperados por condensação.
A pasta sofre uma diluição com licor negro fraco e segue para um sistema de separação de cavacos não cozidos e nós (depuração inicial). A seguir ela vai para um sistema de lavagem em filtros rotativos a vácuo (com dois ou três estágios de lavagem) gerando o licor negro fraco. Após lavada segue para outro sistema de depuração (constituído de peneiras vibratórias ou hidrociclones) e a seguir para um espessador para aumentar sua consistência. A massa espessada, ou segue diretamente para a produção de papel, ou então para processos intermediários de branqueamento.
O licor negro fraco (com 16-18% de teor de sólidos) será convertido em licor negro forte mediante um sistema de concentração de múltiplos estágios, o qual, após atingir uma concentração de 60-65% de teor de sólidos (modernamente concentra-se até 80%), segue para uma fornalha de recuperação onde é queimado. Da queima deste licor negro forte resultam sais fundidos (smelt) que se depositam no fundo da fornalha na forma líquida.
Estes sais, constituídos principalmente de Na2CO3 e Na2S, são conduzidos por escoamento ao interior de tanques contendo licor branco fraco, resultando em uma solução denominada de licor verde, pois possui tonalidade esverdeada devido à presença de sais de ferro.



Figura 13 – Digestor descontínuo com
aquecimento indireto


Figura 14 – Digestor descontínuo com
aquecimento direto


Figura 15 - Fluxograma de um digestor contínuo (Kamyr)

O licor verde é convertido em licor branco mediante a adição de Ca(OH)2, em uma operação denominada de caustificação, segundo a reação:

Ca(OH)2 + Na2CO3 CaCO3 + NaOH

A taxa de conversão na caustificação é da ordem de 85-90%, pois a reação é reversível.

Inicialmente o hidróxido de cálcio é obtido pela reação de hidratação (apagamento) do óxido de cálcio, segundo a reação:

CaO + H2O Ca(OH)2

O licor branco usado no processo kraft contém NaOH e Na2S numa proporção típica de 5:2 com um pH de 13,5 a 14. Usualmente as perdas de enxofre e soda no processo são supridas mediante adição de sulfato de sódio à fornalha de recuperação (junto com o licor negro forte), de modo que na zona de redução da fornalha ocorra a seguinte reação:

Na2SO4 + 2C Na2S + 2CO2

Portanto, a unidade de recuperação de uma indústria de celulose com processo kraft consiste de três setores básicos:

1. Fornalha de recuperação - equipamento onde é queimado o licor negro concentrado (60-65% de teor de sólidos), resultando os sais fundidos (Na2CO3 + Na2S) que são dissolvidos em um tanque, originando o licor verde;

2. Setor de caustificação - local onde ocorre a reação da cal apagada [Ca(OH)2] com o licor verde, regenerando o NaOH e precipitando CaCO3, o qual, sob a forma de lama é lavado e concentrado em um filtro rotativo a vácuo, resultando no licor branco fraco e numa lama com aproximadamente 75% de sólidos.

3. Setor de calcinação - o CaCO3 parcialmente seco é calcinado, normalmente em um forno rotativo onde ocorre sua decomposição em CaO e CO2 (entre 950 e 1200 oC). O CaO gerado retorna ao setor de caustificação.

6.2.3 – Definições e cálculo da composição de um licor branco para cozimento kraft

Definições segundo a TAPPI (Technical Association of Pulp and Paper Industry):

- Reagente Total: são todos os sais de sódio presentes no licor;
- Álcali Total: NaOH + Na2CO3 + 1/2Na2SO3 (*)
(*) - a presença de Na2CO3 é devida à caustificação incompleta, enquanto que a do Na2SO3 é devida à redução incompleta do Na2SO4 na fornalha.
- Álcali Ativo: NaOH + Na2S
- Álcali Efetivo: NaOH + 1/2Na2S
- Atividade: é a % obtida pela razão
- Causticidade: é a % obtida pela razão
- Eficiência de caustificação: é a % obtida pela razão
- Sulfidez: é a % obtida pela razão

Observação: todas as quantidades dos produtos estão expressas em Na2O.

Exemplo:

Calcular a composição e a concentração de um licor de cozimento kraft para 1.500 g de cavacos de madeira com 55% de umidade (em peso).
Considerar:
- Alcalinidade ativa: 16% (sobre a madeira seca);
- Sulfidez: 20% (sobre a alcalinidade ativa).

Portanto, deverá ser determinado:
a) Quantidade de NaOH necessária (em base NaOH);
b) Quantidade de Na2S (ou de enxofre) necessária (em base NaOH);
c) Concentração (quantidade de água).

Cálculos

1) Determinação do peso de cavaco seco:
1.500 g de cavacos com 55% de umidade representam:
- 675 g de madeira base seca,
- 825 g de água.

2) Cálculo da alcalinidade ativa (AA) - expressa em Na2O;
Estabelecendo-se em 16%, sobre a madeira seca, a alcalinidade ativa (dados experimentais), temos:
AA = Na2S + NaOH = 0,16 x 675 = 108 g (como Na2O)

3) Cálculo da sulfidez
Estabelecendo-se uma sulfidez de 20% sobre a Alcalinidade Ativa (AA), temos:
Na2S = AA x 0,20 = 108 x 0,20 = 21,6 g (como Na2O)
4) Conversão da base de referência (Na2O NaOH):
a) Quantidade de soda:
AA = Na2S + NaOH  NaOH = AA – Na2S
NaOH = 108 – 21,6 = 86,4 g (como Na2O)
ou: NaOH = 86,4 x
Pois: Na2O + H2O = 2 NaOH
Logo: NaOH = 86,4 x = 111,48 g (como NaOH)

b) Quantidade de sulfeto de sódio:
Na2S = 21,6 x = 21,6 x 78/62 = 27,17 g (como Na2S)

5) Adição de enxofre para gerar sulfidez:

Admitindo-se que, ao invés da adição direta de sulfeto de sódio ao processo, adicione-se enxofre elementar e hidróxido de sódio, de modo que ao reagirem entre si dentro do reator formem sulfeto de sódio na quantidade exigida para o cozimento, segundo a reação:

4 S + 6 NaOH 2 Na2S + Na2S2O3 + 3 H2O
(128) (240) (156)

a) Cálculo da quantidade de enxofre:
Enxofre = 27,17 x 128/156 = 22,29 g

b) Cálculo da quantidade adicional de NaOH:
NaOHadicional = 27,17 x 240/156 = 41,8 g

6) Quantidade de água necessária ao cozimento:

Considerando-se que a concentração do licor de cozimento deve ser da ordem de 50 g/L, referido à AA e expressa em base NaOH, temos:

AA = NaOH + Na2S = 111,48 + 27,17 = 138,65 g
Água necessária = 138,65 x 1.000/50 = 2.773 mL
Descontando-se a umidade do cavaco, teremos:
Quantidade de água a ser adicionada = 2.773 – 825 = 1.948 ml (2,0 L)
7) Resumo:

Para polpear 1.500 g de cavacos com 55% de umidade, pelo processo kraft, precisamos de um licor constituído de:

a) Com adição direta de soda e sulfeto de sódio:
NaOH – 111,48 g
Na2S – 27,17 g
Água – 1.948 g (2,0 litros)

b) Com adição de soda e enxofre (com formação de sulfeto in situ):
NaOH – 153,28 g
Enxofre – 22,29 g
Água -  2,0 litros (ignorando-se a pequena quantidade de água formada na reação)

6.2.4 - Fator H

Este parâmetro, estabelecido por Vroom e denominado de Fator H, é uma função do tempo e da temperatura utilizada no cozimento ótimo de determinada madeira pelo processo kraft, ou seja:
H = f (t,T)

A sua determinação está baseada na equação de Arrhenius:

ln K = B – A/T
onde:
T = temperatura absoluta,
K = velocidade relativa da reação,
B, A = constantes para uma determinada reação.

Segundo Naass: A = 16.113
Fixando-se arbitrariamente K = 1 a 100 oC, tem-se:
0 = B – 16113/373 (pois ln 1 = 0)
logo: B = 43,2

Portanto, a expressão de Arrhenius fica na forma:

K =

Logo, conhecendo-se a curva de variação da temperatura em função do tempo de um cozimento e, empregando-se os valores das velocidades relativas (Ki) determinados pela expressão acima ou através de valores tabelados (Tabela 1) pode ser traçada a curva da variação da velocidade em função do tempo (em horas) para este cozimento, de acordo com a Figura 16. O cálculo da área sob esta curva resulta no Fator H, o qual pode ser determinado mediante integração gráfica (regra de Simpson).

Método simplificado: H = =

Para uma ótima deslignificação:
- madeiras de eucalipto: H  700
- madeiras de coníferas: H = 1.500 a 2.000


Figura 16 – Variação da temperatura e velocidade relativa
de reação em função do tempo de cozimento







Tabela 1 – Variação da velocidade relativa com a temperatura


Exemplo de cálculo do Fator H e do tempo ótimo de cozimento (método simplificado)

Neste exemplo (Tabela 2) verifica-se a variação do tempo necessário de cozimento de determinada madeira para atingir o mesmo valor do Fator H, quando ocorre variação da temperatura de cozimento.

Tabela 2 – Cálculo do Fator H e do tempo total de cozimento


Deve ser observado que é possível alcançar maior precisão no resultado se as temperaturas forem tomadas em intervalos menores de tempo de cozimento na fase de elevação da temperatura.
Normalmente, na produção industrial, as condições de aquecimento do equipamento são conhecidas e controladas automaticamente (tanto elevação como manutenção da temperatura). Portanto, neste caso, basta determinar-se previamente em laboratório qual o Fator H correspondente a um bom cozimento e após fixar-se o tempo total da operação de cozimento (desde o início).

6.2.5 - Processo sulfito

Este método, desenvolvido em 1867 pelo químico americano Benjamim Tilghmann, dominou absoluto por cerca de 100 anos o processo produtivo de pastas químicas de celulose de madeiras. O processo sulfito base cálcio foi o método dominante e, devido aos preços extremamente baixos do calcário e do enxofre (muito abundantes) não havia motivos econômicos para recuperação destes reagentes químicos do licor residual do cozimento. Consequentemente, isto vinha ocasionando um enorme impacto ambiental.
Em 1955 começaram a aparecer alguns resultados de pesquisas (notadamente nos países escandinavos) visando substituir o cálcio por outras bases (Na, NH4 e Mg), de modo a possibilitar a recuperação simultânea de energia e reagentes químicos dos processos. Isto porque o produto resultante da queima do licor residual, base cálcio, é o CaSO4, que é impróprio para conversão em sulfito de cálcio.
Por volta de 1960, iniciou-se a imposição de proteção do meio ambiente, obrigando as industrias a queimarem ou então tratarem seus efluentes, sob pena de terem de parar sua produção. Isto ocasionou o fechamento de muitas unidades pequenas, face ao alto investimento necessário para resolver o problema. Desde então, toda a expansão da capacidade de produção de pastas químicas voltou-se ao processo kraft, apesar deste necessitar de um sistema complexo de recuperação dos produtos químicos envolvidos no processo.
Todavia, modernamente, estão se desenvolvendo processos semi-químicos de polpeamento (pastas de alto rendimento) que envolvem o uso de sulfito, tais como: quimomecânico e quimotermomecânico. Isto se deve ao fato de que, sendo o processo sulfito bastante versátil, pode propiciar rendimentos de polpeamento que variam de 35 a 90%, dependendo da concentração do licor de cozimento e das condições operacionais. As pastas de alto rendimento, como será visto adiante, substituem as pastas químicas com vantagens econômicas em inúmeras aplicações.
O processo de produção de polpa sulfito começa com a preparação do licor de cozimento, denominado de “ácido”.
Inicialmente é feita a queima de enxofre (ou pirita) em queimadores e fornos apropriados, em condições tais que se obtém o SO2 da forma mais econômica possível.

S + O2 SO2

A quantidade de ar utilizada, bem como o rápido resfriamento do SO2 gerado, devem ser bem controlados, afim de evitar a formação de SO3, o que provocaria maior corrosão do equipamento, além de comprometer a qualidade do ácido (licor) devido à formação de sulfato.

SO2 + 1/2 O2  SO3

A preparação do licor de cozimento consiste em fazer reagir o SO2 (resfriado à cerca de 40 oC) em contracorrente com soluções ou suspensões de NaOH, Ca(OH)2, Mg(OH)2 ou NH4OH, em uma torre de absorção. A solução aquosa contém de 4 a 8% de SO2 livre e de 2 a 3% de SO2 combinado. A quantidade de SO2 livre na solução final estabelece o seu pH, pois um excesso de SO2 conduz a um licor neutro ou ácido, com formação de bissulfito [ex. NaHSO3 ou Ca(HSO3)2 ].
A maior vantagem dos processos sulfito ácido e neutro, está no fato de que a pasta que sai do digestor tem alvura entre 50 e 60%, podendo ser utilizada na fabricação de vários tipos de papeis, mesmo na forma não branqueada. No entanto, as desvantagens em relação ao processo kraft são várias, dentre elas:
- sistema de recuperação dos reagentes (ou tratamento dos efluentes) bastante onerosa e complexa;
- alto custo dos equipamentos envolvidos e de manutenção (corrosão).

6.2.6 - Processos de alto rendimento
Face à demanda crescente de celulose (crescimento médio de 3% ao ano), à estratificação da maioria das reservas florestais no mundo e o aumento gradual do custo da energia, despertou um interesse acentuado nos países produtores de celulose por processos de polpeamento de alto rendimento, ou seja, aqueles que apresentam rendimentos superiores a 60% na transformação da madeira em pasta.
Estas pastas, que apresentam constituintes não celulósicos da madeira (com teores variáveis) são aplicadas na produção de determinados papéis, cartões ou papelões, cuja resistência às condições ambientais e demais propriedades físicas e mecânicas não sejam muito exigentes, comparativamente aos produtos feitos com pastas químicas. Isto vem de encontro a uma relação custo/benefício bastante favorável, uma vez que as pastas de alto rendimento tem um custo produtivo bem inferior às pastas químicas.
Exemplificando, podemos considerar papéis absorventes, do tipo higiênico (tissues). Estes papéis, desde que tenham cumprido sua finalidade de uso, são jogados fora ou destruídos. Portanto tem vida curta e não são recicláveis e, além disso, um número reduzido de especificações. Isso justifica sua produção com pastas de menor custo.

6.2.6.1 - Tipos de processos de alto rendimento.
Os principais tipos de pastas de alto rendimento produzidas comercialmente, são:
1) Pasta mecânica de mó (Stone groundwood pulp – SGWP):
É obtida por desfibramento de madeira roliça em mó, à pressão atmosférica. Seu rendimento é da ordem de 95-97%.

2) Pasta mecânica de mó pressurizada (Pressurized stone groundwood – PSGWP):
É obtida por desfibramento de madeira roliça em mó, sob pressão (equipamento fechado e pressurizado). Seu rendimento é superior a 90%.

3) Pasta mecânica de desfibrador despressurizado (Refiner mechanical pulp – RMP):
É obtida por desfibramento de madeira ou de seus resíduos sob a forma de cavacos ou serragem, em desfibrador de disco sob pressão atmosférica. Rendimento em torno de 95%.

4) Pasta termomecânica (Thermomecanical pulp – TMP):
Desfibramento em desfibrador de disco, sob pressão, de cavacos, serragem de madeira ou então de resíduos agrícolas (palhas de cereais), previamente aquecidos com vapor saturado. Rendimento da ordem de 92-94%.

5) Pasta quimomecânica de mó (Chemimechanical pulp – CMP):
Desfibramento em mó, sob pressão atmosférica, de madeira roliça, prévia e levemente tratada com reagentes químicos. Rendimento em torno de 90%.

6) Pasta quimomecânica de desfibrador de disco (Chemimecanical pulp – CMP):
Desfibramento em desfibrador de disco, sob pressão atmosférica, de cavacos, serragem de madeira ou então de resíduos agrícolas (palhas de cereais), prévia e levemente tratados com reagentes químicos. Rendimento em torno de 90%.

7) Pasta quimo-termomecânica (Chemi-thermomechanical pulp – CTMP):
Desfibramento em desfibrador de disco, sob pressão, de cavacos, serragem de madeira ou resíduos agrícolas, prévia e levemente tratados com reagentes químicos. Rendimento em torno de 90%.

8) Pasta mecano-química:
Pastas mecânicas, obtidas por qualquer processo e que sofrem um tratamento químico posterior ao desfibramento. Processo ainda em estudos.
9) Pasta semiquímica com soda a frio (Cold soda pulp ou chemimechanical pulp):
Desfibramento com desfibrador de disco, sob pressão atmosférica, de cavacos tratados com solução de hidróxido de sódio. Cozimento sob condições mais suaves e tempos mais curtos em relação aos processos químicos convencionais. A concentração dos reagentes também é menor. O rendimento pode variar de 80 a 90%.

10) Pasta semiquímica ao sulfito neutro (Neutral sulfite semichemical pulp – NSSC):
Os cavacos são aquecidos com vapor e a seguir impregnados com solução de sulfito e carbonato de sódio com um pH entre 8 e 9. Posteriormente são cozidos com vapor em temperaturas entre 160 e 180 oC por 15 a 60 minutos. O rendimento pode variar de 75 a 85%.

11) Pasta semimecânica com soda à quente (Hot soda semichemical pulp):
Este processo é mais utilizado para resíduos agrícolas, os quais são inicialmente aquecidos com vapor à pressão atmosférica, impregnados com solução de hidróxido de sódio a 8-10% e após cozidos com vapor à temperaturas de 160 a 180 oC por 15 minutos ou mais.

6.2.6.2 - Produção de pasta mecânica de mó

O processo inicia com o recebimento da madeira, a qual será descascada e cortada em pequenas toras de dimensões apropriadas que seguem para o desfibramento.
O desfibramento da madeira, feito no desfibrador de mó (ou rebolo), é efetuado pressionando-se a tora transversalmente contra a superfície da mó em rotação. Durante a operação, chuveiros aspergem água quente sobre a superfície da mó, estando sua parte inferior parcialmente submersa na suspensão de fibras.
A suspensão de fibras (com consistência entre 1 e 3%) é depurada em peneiras vibratórias, primeiro em uma peneira para remoção de material grosseiro e após, em outra peneira, para a remoção dos finos. O rejeito destas peneiras é constituído de lascas de madeiras (final das toras), feixes de fibras e palitos e normalmente é jogado fora ou queimado, podendo, todavia, serem desfibrados em desfibradores de disco e reincorporados à massa da pasta depurada. Esta pasta passa ainda por depuradores centrífugos (hidrociclones) afim de eliminar sujeiras e rejeitos residuais. A seguir a pasta passa por equipamentos engrossadores, com a finalidade de aumentar sua consistência e, depois, segue para os diferentes pontos do processo (prensa desaguadora, secagem, enfardamento, etc.).
O equipamento mais importante do processo é o desfibrador de mó, de acordo com a Figura 17. Sua alimentação pode ser manual ou automática. As toras são colocadas no armazém (magazine) do equipamento e um pistão hidráulico pressiona-as sobre a superfície da mó. A mó é acionada por um motor síncrono ou por turbina hidráulica. A pressão exercida pela madeira sobre a mó (pressão específica) é controlada automaticamente, e depende das propriedades finais da pasta, geometria e velocidade de rotação, características da grana e sulcos da pedra.
Conforme pode ser visto na Figura 18, a mó é constantemente molhada, por meio de chuveiros, com água branca quente (água branca é aquela que sai dos engrossadores ou então das máquinas de papel resultante do desaguamento da polpa). A função desta água é resfriar a superfície da pedra e mantê-la limpa.
A velocidade periférica da pedra está na faixa de 18 a 25 m/s (pode chegar a 30 m/s), cuja rotação varia de 200 a 250 rpm. Normalmente a pedra fica assentada sobre uma cuba de concreto que recebe a massa de fibras separadas da madeira junto com a água dos chuveiros, formando uma suspensão (pasta de madeira). Sua consistência varia de 1 a 6%, dependendo da produção de fibras e da vazão da água dos chuveiros. Na cuba a pasta é mantida em determinado nível, de modo a submergir parcialmente a mó, o qual é controlado por uma comporta regulável. Sua finalidade principal é resfriar a pedra.
Depois de um certo período de trabalho, a mó necessita ter sua superfície escariada (sulcada). Para isso é usada uma ferramenta especial chamada de carretilha, que pode ser vista na Figura 19, a qual consiste em um cilindro de aço revestido com material de alta dureza (vídia, por exemplo) formando ranhuras retas ou helicoidais quando pressionada contra a pedra por meio de um torno, de acordo com a Figura 20.


Figura 17 – Esquema de um desfibrador Figura 18 – Posição dos chuveiros sobre a mó
de mó
Mediante uma rotação controlada da pedra e um avanço também controlado do torno, acasiona a impressão na superfície da pedra, conforme a Figura 21.



Figura19 – Tipos de carretilhas Figura 20 – Torno de afiação da mó


Figura 21 – Sulcamento da superfície da mó

O intervalo de tempo de afiação da pedra depende de várias condições:
- Tipo da pedra: se artificial (carbeto de silício) ou natural (granito);
- Tipo de madeira desfibrada;
- Condições operacionais: eficiência de resfriamento, velocidade de operação, pressão específica exercida pela madeira sobre a pedra, etc.
No processo de desfibramento da madeira com mó, a madeira é submetida não só aos atritos combinados de rolamento e de fricção, ocasionados pelo roçamento entre esta e as pontas da superfície da pedra, conforme a Figura 22, mas também aos ciclos de compressão e descompressão.
Como pode ser visto na Figura 23, estes ciclos ocorrem devido à passagem alternada de pontas e cavidades da superfície da pedra sobre determinado ponto da madeira. A energia cedida
pelo processo à madeira ocasiona elevação da temperatura em sua superfície amolecendo a lignina, facilitando o processo de desfibramento.
A energia absorvida pela madeira é transferida em cerca de 50% para a pedra (50%) e o restante para a pasta que está sendo produzida. A transferência de calor à pedra se dá através do filme líquido presente na zona de desfibramento. Por isso é muito importante a qualidade e a quantidade da água utilizada no resfriamento.
Figura 22 – Pontos de atrito da mó Figura 23 – Pulsos de compressão e sobre a madeira descompressão sobre a madeira

Existem vários modelos comerciais de desfibradores de mó, sendo que a madeira a ser desfibrada na mó também pode ser alimentada por 2 ou 3 pontos, conhecidos como bolsas ou magazines, conforme pode ser visto nas Figuras 24, 25 e 26.

Figura 24 – Desfibrador com duas Figura 25 – Desfibrador com três bolsas
bolsas (Voith)

Figura 26 – Desfibrador com alimentador gigante
A pasta mecânica de mó é utilizada em inúmeros tipos de papéis e papelões, tanto isolada como combinada com outros tipos de pastas. O maior consumidor de pasta mecânica é o papel de imprensa, cuja composição média é:

- pasta mecânica de mó..........................71 a 82%
- pasta química.......................................18 a 25%
- cargas e aditivos....................................0 a 4%

Outros usos para pasta mecânica:

- papéis higiênicos (toilet), toalhas e lenços (tissues) e embrulho;
- papéis e papelões para a construção civil: construção, isolamento de fios, papel de parede e papelão prensado para isolamento acústico e térmico;
- papéis para embalagens: sacos, papelão ondulado e cartões flexíveis;
- papéis de impressão (revestidos): livros e revistas.

7. BRANQUEAMENTO DE PASTAS DE CELULOSE

7.1 - Generalidades
O polpeamento químico promove uma deslignificação da madeira, mas, como já comentado anteriormente, devido às condições severas a que a madeira é exposta, pode ocorrer também degradação da celulose e hemicelulose. No intuito de protegê-las, o processo nunca deve ser conduzido até o ponto de remoção total da lignina. Neste caso, resta na polpa final um pequeno percentual de lignina residual, a qual, quando necessário, será removida por processos de branqueamento, que não são tão agressivos.
Portanto, a cor das pastas de celulose é devida principalmente aos derivados de lignina que foram formados durante o polpeamento e nela permaneceram. A intensidade da cor também pode aumentar posteriormente mediante reações de degradação com o oxigênio do ar e também devido à radiação ultravioleta da luz solar. Também contribuem para a coloração, a presença de íons metálicos, resinas ou outras impurezas. A coloração, de acordo com o processo de produção, varia desde marrom escuro (processo kraft) até amarelo claro (processos de alto rendimento).
Seja qual for a finalidade do papel produzido, a alvura representa um fator importante em
sua comercialização, já que, além do consumidor preferir um produto mais branco ou mais claro,
permite impressões mais definidas quando necessárias.
Os reagentes utilizados no branqueamento de pastas químicas são, em sua maioria, compostos oxidantes, os quais conferem à pasta alvura mais estável. Também há processos que utilizam compostos químicos redutores, apenas alterando quimicamente os compostos coloridos (cromóforos) da pasta, não afetando o rendimento e modificando seu aspecto visual. Estes são empregados principalmente em pastas de alto rendimento, uma vez que o teor de lignina sendo elevado, não seria incoerente sua remoção mediante agentes de branqueamento.
Para a produção de papel de qualidade superior e alvura elevada, torna-se necessário a remoção da lignina e de outras impurezas das polpas químicas. Neste caso o branqueamento torna-se um processo de purificação, afetando mais diretamente outras propriedades da pasta (viscosidade, teor de hemicelulose e propriedades físicas e mecânicas).
No caso de pastas químicas e semiquímicas (rendimento menor do que 60%), o teor de lignina residual na pasta pode ser estimado mediante a determinação do Número Kappa, o qual permite uma avaliação do grau de deslignificação atingido pelo processo e posterior facilidade (ou dificuldade) de beneficiamento da pasta obtida. Este ensaio consiste na determinação da quantidade de permanganato de potássio gasto para remover a lignina residual de uma determinada amostra de celulose, segundo método padronizado, a qual, mediante correções estabelecidas pelo método, resultará no Número Kappa (vide anexo).
A estabilidade da alvura é outra característica importante, pois com o tempo a cor pode sofrer alterações, tornando o material amarelado ou escurecido. A reversão é acelerada pela luz, calor e umidade elevada, dependendo ainda do tipo de pasta e do processo de branqueamento utilizado. A alvura será menos estável quando for empregado um agente redutor no processo de branqueamento, pois a longo prazo o oxigênio do ar oxida novamente as formas reduzidas dos compostos coloridos derivados da lignina.

7.2 - Principais agentes de branqueamento

Os reagentes utilizados enquadram-se em dois tipos:

Bissulfito de sódio (NaHSO3)
Ditionitos de zinco e sódio (ZnS2O4 e Na2S2O4) –(antigamente
- Reagentes redutores conhecidos por hidrossulfitos)
Borohidreto de sódio (NaBH4) – (também conhecido por tetrahidroborato de sódio)

Peróxido de hidrogênio (H2O2)
Cloro
- Reagentes oxidantes Dióxido de cloro (ClO2)
Hipoclorito de sódio (NaClO)
Oxigênio
Ozônio (O3)

Os tipos mais utilizados para pastas químicas são os oxidantes, face aos custos e estabilidade da alvura.
Considerando-se que o objetivo do branqueamento das pastas é a obtenção do grau de alvura desejado e estável, com um custo mínimo de reagentes e equipamentos, sem prejuízo das características físico-mecânicas do produto, este objetivo será mais facilmente atingido se for utilizada uma combinação de vários reagentes em vários estágios, alternando-se, por exemplo, estágios de oxidação com estágios de lavagens simples ou alcalinas.
Os reagentes utilizados nos processos de branqueamento são representados por símbolos, de modo que um processo combinado pode ser representado por uma sigla.
Exemplos:
Cloro – C (cloração),
NaOH – E (extração alcalina), E0 (extração alcalina com oxigênio),
NaClO – H (hipocloração),
ClO2 – D (dioxidação),
H2O2 – P (peroxidação),
O2 – O (oxigênio),
O3 – Z (ozonização),

Portanto, a sigla CEHD, representa um processo combinado de: cloração – extração alcalina – hipocloração – dioxidação, com lavagem da pasta entre os estágios. Quando houver uma barra entre dois estágios de uma sigla, significa que não há lavagem entre estes dois estágios. Por exemplo (o mesmo): CEH/D. Neste caso não há lavagem da pasta entre os estágios de hipocloração e dioxidação.
Há muito tempo que se sabe que os processos de branqueamento com cloro geram produtos muito tóxicos nos efluentes (principalmente clorofenóis) e, mediante estudos realizados a cerca de 15 anos atrás, constatou-se a presença de dioxinas nestes efluentes.
A presença destas dioxinas, extremamente tóxicas, nos efluentes torna difícil ou impossível um tratamento eficaz com técnicas convencionais. Isto tem gerado uma polêmica internacional, ocasionando a proibição de alguns países em importar ou comercializar celulose branqueada com cloro. Como conseqüência, os países produtores e exportadores de celulose (inclusive o Brasil) estão modificando seus processos de branqueamento, eliminando gradualmente o uso de cloro elementar e seus derivados, buscando alternativas mediante o uso de oxigênio, peróxido de hidrogênio e ozônio.

Com isso, as polpas produzidas estão sendo classificadas como ECF (Elementary Chlorine Free) ou TCF (Total Chlorine Free). Todavia, existem muitas controvérsias técnicas, exigindo estudos mais profundos destes processos, pois ainda são considerados não tão eficazes quanto àqueles que empregam cloro ou seus derivados, inclusive prejudicando as qualidades finais da polpa.

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